25º FESTCURTASBH – MOSTRA “MANIFESTAR O DESEJO”

Estreia é no dia 14, no Cine Humberto; são quatro programasalém de conversas com as curadoras Mónica Delgado e Ivonne Sheen Mogollón após a exibição dos curtas-metragens


25º FestCurtasBH – FESTIVAL INTERNACIONAL DE CURTAS DE BELO HORIZONTE

[presencial] 11 a 22 de outubro de 2023 | [on-line] 14 a 22 de outubro de 2023

[presencial] MOSTRA MANIFESTAR O DESEJO

14 a 17 de outubro, sempre às 17h, no cine Humberto Mauro

[presencial] MESA REDONDA – MANIFESTAR ENTRE EXPERIÊNCIAS E
EXPERIMENTAÇÕES: CINEMA E AUDIOVISUAL FEITO POR MULHERES

18 de outubro, às 17h, no Cine Humberto Mauro

Com a participação de Ivonne Sheen Mogollón, Mónica Delgado e

 Juliana Gusman | Mediação: Cláudia Mesquita

[local] Palácio das Artes – Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro

[informações] contato@festcurtasbh.com.br | (31) 3236-7367


Victoria Black and Woman. (Crédito: Torgeir Wetal).

As mostras especiais revelam o DNA do 25ª FestCurtasBH. Uma delas, “Manifestar o desejo: mulheres e dissidências no cinema latino-americano (1966-2021)” terá a primeira sessão no dia 14 e revela o cinema de mulheres latino-americanas, com recorte histórico e contemporâneo, sob curadoria das realizadoras e pesquisadoras peruanas Ivonne Sheen Mogollón e Mónica Delgado. De acordo com a curadoria, os curtas têm um caráter familiar, pessoal e íntimo e escapam dos limites de exibição cinematográfica dos festivais.

Segundo Ana Siqueira, curadora do FestCurtas, as mostras especiais dão a cara do Festival a cada ano. “Nesta edição, queríamos olhar para este cinema extraordinário e pouquíssimo conhecido, que são os filmes de invenção, com engajamento formal, político na feitura mesmo, realizados por mulheres na América Latina. Mónica e Ivonne fizeram um trabalho de pesquisa, de prospecção. Ao contar a história desse cinema feito por mulheres aos olhos dessas outras duas mulheres descobrimos uma pluralidade extraordinária”, disse.

O Ministério da Cultura, Governo de Minas Gerais, Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais, Fundação Clóvis Salgado e Secretaria Municipal de Cultura apresentam o 25º FestCurtasBH – Festival Internacional de Curtas de Belo Horizonte. O Festival tem patrocínio máster da Cemig e conta com o apoio da MGS por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, da Embaixada da França no Brasil e do Instituto Cervantes. A Fundação Clóvis Salgado tem como mantenedores a Cemig e o Instituto Cultural Vale, Patrocínio Master da ArcelorMittal, Patrocínio da Usiminas e Correalização da APPA – Arte e Cultura.

Latinidades múltiplas a partir do feminino – De acordo com Mónica Delgado, sua principal motivação ao escolher a seleção de curtas foi construir uma série de correspondências entre as obras, principalmente para colocá-las em diálogo em cada programa, antes de propor apenas um panorama do cinema latino-americano feito por mulheres. “São curtas-metragens realizados em diferentes contextos e processos da região, alguns políticos, outros mais íntimos”, destaca a codiretora da plataforma Desistfilm.

Para Ivonne Mogollón, a seleção reflete sua posição pessoal de pensar além do gênero “mulher”. “As pessoas que se identificam como mulheres são diferentes entre si e, no meu caso, considerei empregos de pessoas não-binárias. Esse não é apenas um programa ‘mulheres’, mas também inclui trabalho dissidente. São experiências que partilhamos e penso que é importante saber o que está a acontecer nos países vizinhos, por vezes chamados ‘países irmãos'”, salienta.

QUATRO PROGRAMAS

A mostra “Manifestar o desejo: mulheres e dissidências no cinema latino-americano” exibe 29 filmes em quatro programas — “As adversidades interiores”, “Sobre corpos e cargas pesadas”, “Desfazendo latitudes” e “Para além do território” —, que dialogam entre si e propõem um percurso ao longo de mais de 50 anos, entre 1966 e 2021. Para Mónica, o que une o trabalho dessas cineastas é o interesse em filmar mulheres. “Não há muito em comum, estamos deixando para os espectadores encontrarem as pistas”, provoca. Ivonne concorda com Mónica: “Decidimos afastar-nos da classificação das mulheres como ‘lugar-comum’, uma vez que as experiências de vida de cada uma são muito diferentes umas das outras”, acrescenta.

Por meio de um grupo de cineastas e artistas de diferentes épocas e contextos, as curadoras exploram seus modos de colocar os espectadores em contato com as realidades de homens e mulheres da América Latina, a partir da perspectiva de Joëlle de La Casinière, das convicções de Rossana Lacayo, das proclamações de Victoria Santa Cruz, dos gritos de Tatiana Gaviola, das lembranças e saudades de Génesis Valenzuela ou dos pedidos de justiça do Coletivo Los Ingrávidos. “Todos os trabalhos procuram deixar claro que existe um olhar de mulher por trás da câmera, existe um ponto de partida que é o próprio lugar de onde vem o cineasta e onde o cinema é uma janela para entrar nessa realidade”, destaca Mónica.

Dessa maneira, as realidades se multiplicam na tela: Castiel Vitorino e Cristina Miranda se aproximam da ancestralidade afro-brasileira para invocar presença da memória colonial a partir do presente; Viviana Mamani Cori e Florencia Mamani dialogam sobre suas raízes a partir da ascendência indígena; Irma Cabrera se preocupa com a ancestralidade da água a partir do presente que a contamina; Annalisa D. Quagliata aproveita o meio cinematográfico analógico para dar vida a Xochipilli, deus do amor na mitologia asteca; Daniela Delgado Viteri reivindica um testemunho da sua origem equatoriana através do seu presente na Espanha; Maite Mérida revive memórias de manifestações feministas no Chile; e María Domínguez e Luciana Decker compartilham a celebração de Todos os Santos em La Paz, na Bolívia.

Após cada uma das quatro sessões programadas, as curadoras realizarão debates e comentários com os espectadores nos dias 15, 16 e 17 de outubro, no Cine Humberto Mauro. As conversas serão realizadas em espanhol e contarão com mediação da equipe de curadoria do FestCurtasBH e tradução para o português. No dia 18, Mónica e Ivonne encerram sua participação no Festival com a mesa-redonda “Manifestar entre Experiências e experimentações: cinema e audiovisual feito por mulheres”, com a participação da jornalista, professora e pesquisadora Juliana Gusman, doutoranda do programa de pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP), e mediação da professora Cláudia Mesquita (UFMG).

Suco de Sábado. (Crédito: Ana Poliak)

Programação

Cine Humberto Mauro – Palácio das Artes

14/10 | SÁBADO

17h | MOSTRA MANIFESTAR O DESEJO (Programa 1 – As adversidades interiores) | 77’ | 16 anos

Guanabacoa: Crónica de Mi Familia (Guanabacoa: Chronicles Of My Family / Guanabacoa: Crônicas da Minha Família), de Sara Gómez | Cuba, 1966, 14’

Suco de Sábado, de Ana Poliak | Argentina, 1987, 9’

Y Si Eres Mujer? (What If You Are A Woman? / E Se For Uma Mulher?), de Guadalupe Sánchez Sosa | México, 1976, 7’

Casa Particular (Private House), de Gloria Camiruaga | Chile, 1990, 10’

Por La Mañana (In The Morning / Pela Manhã), de Patricia Restrepo, Bellien Maarschalk | Colômbia, 1979, 8’

Un Sueño Como de Colores (A Dream As In Colours / Um Sonho Como Em Cores), de Valeria Sarmiento | Chile, 1973, 11’

Luna de Almendra (Almond Moon / Lua De Amêndoa), de Rosamaría Álvarez Gil | Perú, 1990, 13’

Legítima Defensa (Self Defense / Autodefesa), de Marie Louise Alemann | Argentina, 1980, 8’

*Sessão seguida de conversa com a curadora Mónica Delgado

15/10 | DOMINGO

17h | MOSTRA MANIFESTAR O DESEJO (Programa 2 – Sobre corpos e cargas pesadas) | 73’| 12 anos

Victoria – Black and Woman (Victoria – Mulher e Negra), de Torgeir Wetal | Peru, Dinamarca, 1978, 21′

Canto Errante (Wandering Song), de Génesis Valenzuela | Espanha, República Dominicana, 2022, 7’

Un Secreto Para Mi Sola (Um Segredo Somente Meu), de Rossana Lacayo | Nicarágua, 1987, 29’

Coyolxauhqui, de Colectivo Los Ingrávidos | México, 2017, 10’

Yo No Le Tengo Miedo A Nada (Não Tenho Medo De Nada), de Tatiana Gaviola | Chile, 1984, 6’

*Sessão seguida de conversa com a curadora Mónica Delgado 

**Alguns filmes desta sessão contêm imagens que podem afetar espectadores suscetíveis a ataques epilépticos ou a outros distúrbios causados pela sensibilidade à luz

16/10 | SEGUNDA

17h | MOSTRA MANIFESTAR O DESEJO (Programa 3 – Desfazendo latitudes) | 77’ | 16 anos

A Hidra do Iguaçu (The Iguaçu Hydra), de Cristiana Miranda | Brasil, 2020, 14’

Tránsito Liminal (Liminal Transit / Trânsito Liminar), de Viviana Mamani Cori | Bolívia, 2020, 10′

Cintas y Lazos (The Ribbons and Ties That Bind Us Together / As Fitas e os Laços Que Nos Unem), de Maite Mérida | Chile, 2021, 2’

De Las Heridas Renaceremos (From Our Wounds We Will Rise / De Nossas Feridas Renasceremos), de Maite Mérida | Chile, 2021, 1’

La Fuente de Agua (The Water Source, A Fonte De Água), Irma Milagros Cabrera Abanto | Perú, 2019, 3’

Xochipilli, de Annalisa D. Quagliata | México, 2018, 1’

Todxs Queremos Un Lugar Al Que Llamar Nuestro (We All Want A Place To Call Our Own / Todxs Queremos Um Lugar Pra Chamar de Nosso), de Daniela Delgado Viteri | Equador, Espanha, 2021, 12’

Para Todas as Moças, de Castiel Vitorino | Brasil, 2019, 2’

Lluvia con Nieve (Rain With Snow / Chuva com Neve), de Sofia Gallisá | Porto Rico, 2014, 13’

Aquí Yacen Los Restos de Mi Padre Ausente (Aqui Jazem os Restos do Meu Pai Ausente), de Florencia Mamani | Argentina, 2021, 14’

Todos Santos, de María Domínguez | Bolívia, 2019, 5’

*Sessão seguida de conversa com a curadora Ivonne Sheen

Canto Errante. (Crédito: Génesis Valenzuela)

17/10 | TERÇA

17h | MOSTRA MANIFESTAR O DESEJO (Programa 4 – Para além do território) | 78’ | 16 anos

El Imperio de la Ley (The Rule of Law / O Estado de Direito), de Daniela Ortiz | Perú, 2018, 30’

La Huella (The Imprint / A Impressão), de Tatiana Fuentes Sadowski | França, 2012, 18’

De Bombas y Balas (Of Bombs and Bullets / Sobre Bombas E Balas), de Luna Lacra | Perú, 2023, 9’

Tunanteras, de Gerita Zuasnabar | Perú, 2020, 16’

RECORD AR, de Natalia Rojas Gamarra | Perú, 2023, 5’

*Sessão seguida de conversa com a curadora Ivonne Sheen

Confira a entrevista que Mónica Delgado e Ivonne Sheen Mogollón deram ao FestCurtasBH:

O que norteou a curadoria da mostra especial “Manifestar o desejo”, no FestCurtasBH?

Mónica: A principal motivação foi construir uma série de correspondências entre as obras, principalmente para colocá-las em diálogo em cada programa, antes de propor apenas um panorama do cinema latino-americano feito por mulheres. São curtas-metragens realizados em diferentes contextos e processos da região, alguns políticos, outros mais íntimos, portanto gerar possíveis vínculos está no que nós, como curadores, sugerimos: sensibilidades de mulheres em áreas de hegemonia masculina, ou simplesmente posicionamentos em áreas livres de experimentação. Escolhemos essas pontes repletas de motivos, símbolos, figuras sobre o fato de filmar ou gravar onde reside a identidade, a fronteira entre o público e o privado e a diversidade expressiva, sobretudo a partir do documentário.

Yvonne: A curadoria do cinema experimental mais contemporâneo tem sido orientada por um sentimento de desaprender a padronização da experimentação, originária dos países ocidentais. Contudo, pensar em experimentação em países sul-americanos pode refletir a falta de acesso a algumas ferramentas cinematográficas, mas também uma desigualdade de vitrine e exibição para alguns cineastas. Minha seleção reflete minha posição pessoal de pensar além do papel de gênero “mulher”, pensando nisso com um ponto de interrogação: Mulher? Ou seja, as pessoas que se identificam como mulheres são diferentes entre si e, no meu caso, considerei empregos de pessoas não-binárias. Portanto, é importante para mim que isso seja levado em consideração nas comunicações relativas ao programa. Esse não é apenas um programa “mulheres”, mas também inclui trabalho dissidente. Regimes neoliberais, violência, lutas sociais etc., são experiências que partilhamos e penso que é importante saber o que está a acontecer nos países vizinhos, ou como são por vezes chamados, “países irmãos”.

Por que é importante mostrar “as opiniões das mulheres sobre as mulheres” neste momento?

Mónica: Mais do que opiniões, são reflexões, ou seja, sobre o que esse diálogo nos convida a repensar ou construir a partir do que as mulheres passam no próprio ato de filmar ou gravar. E no meu caso, como espectadora que se interessa em adivinhar esses traços comuns, a partir dos gestos na montagem, na encenação ou a partir dos lugares de enunciação. Todos os trabalhos procuram deixar claro que existe um olhar de mulher por trás da câmera, existe um ponto de partida que é o próprio lugar de onde vem a cineasta e onde o cinema é uma janela para entrar nessa realidade.

O que as cineastas selecionadas para a mostra têm em comum?

Mónica: Não há muito em comum. Quero dizer, estamos deixando para os espectadores encontrarem as pistas. Por exemplo, nomeei um dos programas a partir de uma ideia do doméstico, mas não da velha ideia do que acontece dentro de casa como algo dentro do comum, mas sim do que as mulheres transformaram naquele espaço, imaginado como um traço de mudança, de transformação, numa sociedade que pode ser melhor, mais compreensiva, mais empática.

Ivonne: Concordo com a Mónica que decidimos afastar-nos da classificação das mulheres como um “lugar-comum”, uma vez que as experiências de vida de cada uma são muito diferentes umas das outras.

Os curtas-metragens dessas mulheres podem ser entendidos como um manifesto ou um ato político?

Mónica: Para nós, é político que possamos ver, por exemplo, algumas obras que ainda não foram restauradas, por exemplo, e que por essa falta de “arrumação” foram afastadas do imaginário do cinema feito por mulheres na América Latina. E é também político que tenhamos decidido mostrar obras que, por vezes, por critérios de programação, nunca são postas em diálogo: um filme experimental que anda de mãos dadas com uma obra que investiga outros aspectos fundamentais do documentário ou da não-ficção. Os programas são manifestos num sentido menos ambicioso: isto é, são oportunidades de expressão, de encontrar vozes e pontos de vista determinados a mostrar-nos essas realidades, algumas escondidas ou superadas.

O cinema peruano é raramente exibido ou divulgado no Brasil. Diferente do Brasil, as mulheres sempre estiveram presentes na história do audiovisual peruano. Como essas mulheres transformaram a realidade do cinema no Peru? Quais são os pontos de intersecção ou diferença entre o cinema peruano e brasileiro feito por mulheres?

Mónica: O cinema peruano é um cinema jovem e, portanto, sendo pequeno, houve muitas obras feitas por mulheres, mas todas muito emblemáticas ou insulares, como Nora de Izcue, Berta Saldaña, Maria Barea ou Rosamaría Álvarez Gil. Nos últimos anos, houve a necessidade de tornar visíveis suas obras e com elas reconstruir a história do cinema peruano. Os livros de história as ignoraram. Quanto ao Brasil, acho que são histórias diferentes, já que vocês têm uma indústria e tradição muito forte. E as brasileiras que fizeram filmes, como Adélia Sampaio, partiram de temas que no Peru, até hoje, não foram abordados pelas mulheres. O Peru é um país muito conservador, mas aos poucos isso está mudando.

Yvonne: Acrescentando à resposta de Mónica: também os critérios para considerar o que é ou não cinema no Peru têm sido muito abandonados e centralizados numa elite, especialmente masculina. Ou seja, no Peru, os filmes feitos em vídeo e não em filme não eram considerados “cinema”. Muitas mulheres conseguiram fazer filmes com o apoio de ONG’s estrangeiras e outras vias que também não se enquadram no ideal do “cineasta”. Ou seja, no Peru o cinema não corresponde necessariamente aos padrões industriais, o que tem levado ao esquecimento das obras que estão sendo resgatadas. Mas também hoje as novas gerações aproveitam a acessibilidade das tecnologias digitais e analógicas, e há muita produção independente e pequena, que em alguns casos consegue transcender a cena local. Atualmente está sendo proposto um projeto de lei por Andrea Tudela, um congressista conservador, que busca promover um modo de cinema industrial, extrativista e capitalista, que é uma abordagem carregada de um racismo muito profundo. Assim, fazer filmes no Peru como mulher e dissidente, que também não pertence a um setor com poder, é um ato de expressão que resiste e que encontra possibilidades de exibição em eventos autogeridos.


Texto: Fundação Clóvis Salgado


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