DIA DO CINEMA BRASILEIRO É COMEMORADO EM 19 DE JUNHO

Hoje, dia 19, celebra-se uma data memorável: o Dia do Cinema Brasileiro. Essa efeméride presta uma homenagem ao dia em que o cinegrafista e diretor ítalo-brasileiro Afonso Segreto registrou as primeiras imagens em movimento no Brasil: em 1898, o navio onde viajava entrava na baía da Guanabara. Dois anos antes, no dia 5 de novembro de 1896, aconteceu a primeira exibição pública de cinema no Rio de Janeiro, quando foram projetados oito pequenos filmes, de cerca de um minuto cada, para a elite carioca, na rua do Ouvidor. Por causa desses dois acontecimentos, alguns atribuem o Dia Nacional do Cinema Brasileiro ao dia 5 de novembro, outros o comemoram em 19 de junho.

Deus e o Diabo na Terra do Sol (Crédito: divulgação)

Para Comemorar o Dia do Cinema Brasileiro, um dos mais antigos e longevos cineclubes do país, o Cine Humberto Mauro, no Palácio das Artes, faz uma sessão extraordinária dedicada a um dos maiores nomes do movimento Cinema Novo e um de nossos cineastas mais festejados no exterior, Glauber Rocha, com a exibição de  sua obra-prima “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964), uma versão restaurada em 4K, em 35 mm. A sessão gratuita será comentada pelo poeta, artista e pesquisador de intermídia Ricardo Aleixo. Na ocasião, serão ainda sorteados os catálogos da mostra Kynoperzpektyva18, realizada em 2018, que contém os livros “Crítica Esparsa” e “O Nascimento dos Deuses”.

Segundo Vítor Miranda, gerente de cinema da Fundação Clóvis Salgado, o Cine Humberto Mauro sempre foi um espaço de formação de público. “Todo mundo fala isso, que conheceu cineastas e filmes através do cineclube. As pessoas do cinema têm uma devoção muito grande com o espaço”, explica. Como é gratuito, ele recebe não só cinéfilos, mas também pessoas em situação de rua. “Por esse motivo, tentamos trazer uma programação diversa, de repertório e popular, contemplando diversas partes do mundo e de épocas diferentes”, acrescenta. Para o gestor da Humberto Mauro, o cinema é uma parte importante da identidade nacional, de construção de memória, e precisa ser fomentado pelo Estado.

Além de nomes de projeção nacional e internacional como Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Cacá Diegues, Arnaldo Jabor, Walter Salles,  José Padilha e Fernando Meirelles, é importante reverenciar ícones mineiros, como Humberto Mauro, Carlos Alberto Prates Correia, recém-falecido, Maurício Gomes Leite, Helvécio Ratton, Elza Cataldo, Eder Santos e Cao Guimarães, entre tantos outros, como os nomes da nova geração, entre eles Affonso Uchôa, Clarissa Campolina, Helvécio Marins Jr,  Marília Rocha e Gabriel Martins, esse último diretor “Marte Um”, filme que projetou Minas Gerais a além das fronteiras e acabou escolhido para representar o Brasil na disputa por uma vaga no Oscar 2023.

Um desses nomes da velha-guarda é o cineasta  Rafael Conde, dos curtas-metragens “O Ex-Mágico da Taberna Minhota” e “A Hora Vagabunda” e dos longa-metragens “Samba-Canção” e “Fronteira”. Para ele, o cinema brasileiro hoje está diante de questões importantes, mais associadas ao formato do que a estética.  Hoje, afirma ele, existem, além do cinema, novos espaços de exibição como as plataformas de streaming, o que, por sua vez, tem feito o cinema nacional, como o mundial,  serem repensados. “Esses novos canais têm demandado muito. É uma grande produção em filmes e séries que fazem o cinema se expandir cada vez mais. Principalmente após a pandemia, estamos em plena  retomada”.

Conde se prepara para lançar  seu segundo longa-metragem, depois de um hiato de 21 anos,  “Zé”, na 18ª Mostra de Cinema de Ouro Preto, que acontece de 21 a 26 de junho na cidade histórica. Rodado em Cataguases, na Zona da Mata, no final de 2021, o filme é uma ficção baseada em fatos reais. Entre 1946 e 1973, o estudante José Carlos da Mata Machado, o Zé, um líder estudantil interpretado pelo ator Caio Horowicz participa de um grupo de resistência contra a ditadura militar (1964-1985). Perseguido, ele deixa o conforto de uma vida burguesa para trabalhar com alfabetização e conscientização política no interior do Nordeste, na clandestinidade. Mas é perseguido e morto pela ditadura militar.

Sobre o cinema mineiro propriamente dito, Rafael Conde afirma que o cinema brasileiro produzido em Minas é muito forte, até porque ele se desloca muito. O cineasta destaca co-produções de filmes de ficção, de animação e séries de TV. “Com a retomada da Ancine (a Agência Nacional de Cinema anunciou no início deste ano investimentos de mais de R$ 1 bilhão para o setor audiovisual, incluindo projetos cinematográficos de todas as regiões do país, após a total paralisação em 2020 e 2021), os programas voltados para a produções regionais tendem a crescer ainda mais. Há mais filmes autorais, experimentais, sendo feitos. O cinema brasileiro feito em Minas também está sendo reconhecido no Brasil e no exterior.”

Claudia Mesquita, professora de comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), considera simbólica  a data.”O Paulo Emílio Sales Gomes, que era um crítico, uma pessoa devotada à preservação do Cinema Brasileiro e um dos criadores da Cinemateca Brasileira, tem um texto conhecido, ‘Cinema: Trajetória no Subdesenvolvimento’, onde conta a história do cinema desde o começo dos anos 70. Ele explica essa trajetória pela noção de desenvolvimento: marcada por crises, por ciclos, por altos e baixos. Segundo ele, o cinema brasileiro estava sempre começando do zero, sempre ameaçado por uma crise iminente”.

Para o filme brasileiro se afirmar no mercado, Claudia ressalta que há sempre uma dificuldade e uma dependência do aporte do Estado. “Por vezes, a gente vive períodos francamente hostis à arte, à criação, à produção de filmes, como foi o caso do governo Bolsonaro. Como o cinema brasileiro parece sempre sujeito ao diagnóstico que o Paulo Emílio fez nos anos 70, é importante celebrar essa data: esse compromisso com a produção de filmes, com a continuidade das políticas que foram importantes nas últimas décadas, de descentralização da produção, de maior espaço na TV pública, de políticas inclusivas para que outros segmentos possam estar à frente desses processos, como negros, mulheres”, salienta.

Claudia considera que Minas sempre teve uma tradição cinéfila. Ela cita o Centro de Estudos Cinematográficos (CEC), do Cine Humberto Mauro e dos grupos que se uniram em torno dele para proporem diferentes festivais de cinema e reflexões. “Minas Gerais tem pé forte na produção, no estudo, na reflexão. Hoje, a produção faz jus  a essa história. Tem uma cena muito interessante na Grande BH, que de algum modo está em dia com essa ampliação política de horizontes do cinema brasileiro no sentido de quem produz, de quem está na direção”, afirma. A professora lembra a Filmes de Plásticos, em Contagem, formada por diretores periféricos, negros, que estão contando histórias relacionadas a seus universos. 


Texto: Paulo Campos

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